sábado, 10 de setembro de 2011

Entrevista: Paulo Caldas e as videodanças

Paulo Caldas, coreógrafo e bailarino, é idealizador e diretor do dança em foco, Festival Internacional de Vídeo & Dança, primeiro evento brasileiro dedicado exclusivamente a essa interface. O dança em foco esteve em Campo Grande em maio de 2011. Um ano antes, Paulo Caldas também esteve em Mato Grosso do Sul ministrando um workshop de criações coreográficas na Fundação de Cultura, e se transformou, para alguns participantes, também no autor de “O Movimento Qualquer” – artigo encantador que dizia que “todo corpo é simultaneamente restrito e infinito, não importa o que meça, pese, mova ou perceba”.

A postura aberta e estimulante sobre a dança aparece também nesta entrevista que ele deu para o Movimente e para a revista Cultura em MS, sobre videodança.

Quem assistiu à programação internacional da 5ª Semana pra Dança, no MIS, pode ter esbarrado também na 1ª Mostra Regional de Videodança. Ela é mais um dos sintomas da efervescência da videodança no estado - e certamente um estímulo para criações futuras. O blog do Movimente é outro exemplo. Vamos videodançar? – e que no aqui-agora desse verbo inventado e inocente, isso seja também assistir aos trabalhos que conectam dança e vídeo.

A matéria na Cultura em MS sai em novembro, e eu e a Luiza Rosa, que também escreve a reportagem, vamos publicá-la também aqui, no blog do Movimente.

Como estimular a produção da videodança e também contextualizar a diversidade de trabalhos, que surgem de diferentes compreensões sobre a relação entre dança e vídeo? O que se encaixa nessa expressão?

Tem uma coisa que é primeira, me parece. É o fato de que este é um tipo de produção ligado a um contexto de dança contemporânea, sobretudo, e isso coloca de princípio alguns problemas. A própria dança contemporânea não se define facilmente, não se regra facilmente, está atravessada por uma infinidade de maneiras de pensar e de compor. Quando a dança contemporânea se associa com vídeo, o que acontece na videodança, essa questão e essas indefinições ficam potencializadas.

Você acha que vale a pena fazer uma distinção na denominação dos trabalhos, para ajudar a entender melhor a produção realizada atualmente? Há pesquisadores e artistas que consideram que, por exemplo, videodanças são obras que promovem uma hibridização muito única entre dança e video, e os trabalhos que o fazem menos deveriam ser chamados de vídeo de dança, ou de outras denominações.

Acho importante tentar pensar o que está sendo produzido, mas nomear não sei se é a melhor maneira de abordar tudo isso. A questão da definição é problemática e eu diria que ela é quase um falso problema. Acho, inclusive, saudável que os nomes se multipliquem: videodança com hífen, sem hífen, cinedança, coreodança, seja lá mais o que for. Há vários nomes em inglês tentando dar conta disso também, na língua inglesa acho que a variedade de nomes é ainda maior.

Não se tem parâmetro sobre o que deve e o que não deve ser videodança. E cada vez mais isso se abre problematicamente pra um contexto que envolve corpo e imagem, das maneiras mais diversificadas. No âmbito da dança contemporânea, isso se abre cada vez mais pro contexto do corpo – se ele vai estar em movimento ou não, se ele vai estar em um contexto de performance ou não. Isso é muito aberto e muito complexo, muito variado, muito indefinido.

Na sua curadoria para o dança em foco, o que te orienta na escolha do que é ou não é uma videodança? Como se avalia que trabalho deve entrar no festival?

Na condição de um curador que é coreógrafo, tendo a olhar a partir das minhas próprias obsessões – isso significa que, de alguma maneira, eu tento olhar e reconhecer uma dimensão coreográfica em alguma instância do que eu vejo, seja no corpo em movimento, seja numa estrutura de edição que pode ser absolutamente coreográfica, numa abordagem de câmera que pode ser absolutamente coreográfica... Eu tendo a abordar, a princípio, por essa chave.

Ao mesmo tempo, essa é uma chave insuficiente, que não resolve tudo que eu acolho na condição de curador. Eu sou um dos curadores do festival. O Leonel Brum tem um olhar diferente do meu e é diferente também do Eduardo Bonito, e tentamos sempre trabalhar de uma maneira dialogada a partir dessas diferenças.

O próprio formato do dança em foco nos permite incluir obras que em outros contextos talvez não fossem tão facilmente aceitáveis assim. A gente tem, nas condições que se tornaram referência do festival, três telas rodando esses conteúdos simultaneamente em looping, geralmente em espaços de exposição. Isso é uma condição de exibição diferente de uma sala de cinema convencional, e nos permite ter uma abordagem um pouco diferente em relação àquilo que a gente vai exibir. A gente começa às vezes a exibir às 11 da manhã pra acabar às 8 da noite, em looping. Isso nos permite incluir uma série de coisas, arriscar uma série de coisas que festivais que têm outra abordagem talvez não possa ter, uma sala de cinema convencional só com uma programação de três horas de duração, por exemplo.

Como está a organização da mostra?

Nos primeiros anos, a gente fazia uma organização de programas que tinha como referência apenas a geografia. A gente fazia programas Europa 1, Europa 2, Estados Unidos 1, Austrália, Brasil 1, Brasil 2, Brasil 3, America Latina 1, eram apenas referências geográficas. Agora, a gente já concilia as referências geográficas com temas que são mais ou menos recorrentes. Por exemplo: interiores, coreoedições – que são trabalhos que têm a edição como princípio de coreografia. São temas que aparecem, a gente vai reconhecendo e conseguindo montar programas ligados a eixos temáticos. Isso implica um tempo sobre os filmes que é difícil ter, porque são mais de 200 filmes por ano. É um trabalho muito grande, e eu pelo menos fico com a impressão de que era preciso mais tempo. É muito trabalho, mas também sinto que a gente tem evoluído nos últimos anos.

É mais fácil ter uma abordagem curatorial mais rigorosa com obras que você já conhece, que são históricas. O Centro Georges Pompidou, por exemplo, tem um acervo monstruoso acumulado ao longo de anos, então eles produzem eixos temáticos a partir desse arquivo, que é um arquivo sabido.

Dá pra arriscar falar em um histórico da produção no Brasil, a partir do que o festival exibiu e exibe?

Não sei se dá pra falar, porque é uma produção muito variada.

O que hoje tem desafiado ou interessado você na videodança, em ver e fazer? Em 2010, você apresentou o “Grafismos”, considerado outro momento de suas experimentações com o vídeo.

O "Grafismos" têm três conteúdos, videoinstalação, coreografia nelas e mostra de videodanças. Nesses trabalhos que fiz de videodança, peguei fragmentos do último espetáculo que eu tinha feito, o Quinteto, e adaptei, recriei pra vídeo. São trabalhos em que tentei ter um equilíbrio de linguagem, de coreografia e de videografia, vamos dizer assim, como escrita de movimento.





No Duo#1, todo movimento de câmera é coreografado. É um plano-sequência que tem um investimento muito forte em coreografia, e numa linguagem de vídeo que dialoga com coreografia.




Achei interessante resgatar esse material coreográfico porque ele é muito consistente, e eu gosto muito de levar estruturas que tenham consistência coreográfica pro vídeo. Quando parto de materiais que já existem, isso me dá uma base muito sólida pra trabalhar.



3 comentários:

  1. Muito bom rever essas videodanças aqui neste contexto (junto com a entrevista do Paulo). Obrigada Moema pela entrevista e ao Paulo pelas veZes em que contribuiu. Parabéns! Trabalhos de excelência!!!

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  2. Delícia de entrevista, Moema! Deu vontade de ler mais.

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  3. muito bom saber mais sobre o Paulo, refletir sobre videodança e rever os trabalhos dele... e de um jeito leve, caramba. massa, massa, parabéns Moema (e obrigada Paulo).

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