segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Rosas

 foto: Jean Luc Tanghe

Estava saindo do banho, enrolada na toalha, quando ouvi alguém me chamar na porta de entrada da casa. Estava no Centro de Estudos em Dança, em Caieiras, e quem me chamava era Helena, acompanhada de uma moça de cabelo curto, blusa e saia escuras e soltinhas. Me troquei rapidinho e fui até à cozinha cumprimentá-las. 

- Esta é a Anne Teresa, Luiza.

Só consegui dizer que era um prazer conhecê-la, com meu inglês capenga e minha timidez disfarçada num sorriso simpático. Ela retribuiu e a Helena explicou de onde eu vinha para estudar com ela. Completei que o estado fazia fronteira com a Bolívia e Paraguai. Ela respondeu afirmativamente com a cabeça, dando a entender que sabia a que estava me referindo.

Era quinta-feira (29/10), 12:30. Já estava com os ingressos na bolsa para assistir à sua companhia, Rosas, à noite. Precisava só adiantar o máximo possível do primeiro capítulo da dissertação que estou desenvolvendo no mestrado, por isso os 50 Km de distância do centro urbano de São Paulo. 

O nome espetáculo repetia duas vezes o nome da companhia: Rosas danst Rosas (Bélgica, 1983). E por aí comecei a reparar nas reincidências ao meu redor. Meu marcador de livro, o vestido que me inspirei em colocar pra sair, a cor da camiseta que vestia meu acompanhante, meu sobrenome e também o espiral da flor, que repete e parece evoluir. Rosas com rosas. 

Os 20 minutos silenciosos iniciais foram tensos, dava pra sentir na minha própria respiração e no ruído das cadeiras se movimentando, nas tosses. Saindo do tumulto de ônibus cheio, avenidas ruidosas, conversas rápidas, eufóricas, foi difícil entrar na proposta dos movimentos que se repetem, das posturas das quatro mulheres cansadas, cada uma sentada ou deitada em uma parte do palco, ou se movimentando sincronizadamente juntas, em silêncio. Difícil também não fazer relação do que está ali diante da plateia e as imagens em close, big close com ruídos intensificados (como o dos sapatos no chão e as respirações) captadas por Thierry de Mey, no filmedança que dirigiu e que, em parte, foi “adaptado” ou “plagiado” no clipe recente de Beyoncé. Com o contexto, o trecho recebeu outro sentido, o meu sentido sobre aquela obra.

Parecia mesmo crise, dessas que paralisam. O cansaço, as mãos apoiando a cabeça. A repetição de movimentos do cotidiano que vão gerando outros sentidos, tomando outros ritmos. Quatro mulheres, vestidas com blusa e saia soltas e claras, com meias nos pés.

A dúvida de se deixavam ou não a alça da camiseta cair, sorrindo, ou achando tudo aquilo um porre ou indiferente. Com a repetição ficava difícil distinguir quando era espontâneo, quando eram só reencenações, se faziam porque queriam ou porque eram o tempo todo estimuladas a fazer, como a gente faz. Simula, reencena, mas não sabe se o faz pra integrar a toada, como entrar na corda vibrando, vibrando, te chamando para entrar naquele ritmo que bate no chão e: pula!

Relacionado a isso, achei interessante um depoimento de Anne Teresa dizendo que tem “uma profunda convicção de que o corpo questiona a memória das experiências humanas que nele se assentam e que a dança pode tornar as ideias abstratas bem concretas” (veja matéria completa em: Corpos que narram um mundo).

A iluminação, um branco frio, iniciava aberta, depois traçava linhas retas, de um lado ao outro do palco e do fundo ao procênio. Acendia na medida em que as dançarinas ocupavam e criavam aquele espaço. Havia também sincronia da movimentação com a música, com melodia que começava metálica, depois era recomeçava com clarinete, piano e outros instrumentos que não sei nomear...

Para quem se interessar, vale a pena conferir alguns trechos do filmedança Rosas danst Rosas, disponbilizados no youtube.

(Luiza contaminada por Rosas, Dom Casmurro e Capitu)

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